Dossiê denuncia violações na preparação do Rio para os Jogos Olímpicos

Dossiê denuncia violações na preparação do Rio para os Jogos Olímpicos

Imagem Dossiê denuncia violações na preparação do Rio para os Jogos Olímpicos

Por Agência Brasil

Publicado em 08/12/2015, às 20h09

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A quarta versão do Dossiê Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos no Rio de Janeiro, disponibilizada hoje (8) pelo Comitê Popular da Copa e Olimpíadas do RJ e o Observatório das Metrópoles, diz que as violações à moradia permanecem sendo cometidas pela prefeitura da capital fluminense. O documento está sendo divulgado também em outros países, na versão em inglês.


“O dossiê demonstra que as remoções, ao contrário do que a prefeitura vinha anunciando desde o ano passado, não pararam. Estão ainda em curso e parte considerável está associada às intervenções das Olimpíadas, sobretudo em termos de mobilidade”, afirmou o pesquisador do Observatório das Metrópoles, Orlando dos Santos Júnior, professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Ippur-UFRJ), um dos coordenadores do trabalho.

Santos Júnior disse que embora haja dificuldade de se obter informações relacionadas aos Jogos Olímícos de 2016, o comitê procurou identificar as remoções associadas ao evento. “O discurso da prefeitura tem sido que no Rio de Janeiro não existem remoções vinculadas à Olimpíada, exceto da Vila Autódromo”. Para o pesquisador, porém, há uma contradição nesse discurso da prefeitura, que é negar as intervenções vinculadas à mobilidade como parte do Projeto Olímpico. “Só que, no entanto, essas intervenções estão no legado de políticas públicas”. A prefeitura, segundo ele, estaria, com isso, negando os efeitos perversos das remoções.

O Comitê Popular da Copa e Olimpíada identificou que pelo menos 4.120 famílias já foram removidas e outras 2.486 permanecem ameaçadas de remoção, por motivos direta ou indiretamente relacionados às intervenções do Projeto Olímpico.

Segurança

No que se refere à política da ordem e da segurança, o dossiê assegura que o Projeto Olímpico está muito associado à ideia de vender o Rio de Janeiro como uma cidade segura, como ocorre internacionalmente nas demais sedes dos Jogos Olímpicos do Rio. “Só que, na verdade, o projeto está associado a um processo de grande violência junto aos territórios populares, sobretudo aos jovens negros, que são as principais vítimas”. O dossiê denuncia que a política de segurança para a Olimpíada de 2016 é baseada na guerra, em extrema violência, na militarização e no racismo. “Há uma política de genocídio, no sentido que a intervenção nas favelas é tão violenta que está associada ao sistemático assassinato de jovens negros”.

O documento mostra que essa forma de violência está fundada nos autos de resistência. “Você tem semanalmente casos de violência policial associada a essa política de segurança”, disse, citando o recente extermínio, ocorrido na noite do dia 28 de novembro, de cinco jovens de 16 a 25 anos, no bairro de Costa Barros, zona norte do Rio.

De acordo com dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), constantes no dossiê, o número de autos de resistência subiu de 381, em 2012, para 416, em 2013, no estado do Rio de Janeiro, elevando-se para 584, no ano passado. Na primeira metade de 2015, o ISP já registra 349 mortes.

Orçamento

O dossiê faz um esforço para demonstrar que, ao contrário do que afirma a prefeitura, a Olimpíada envolve mais gastos públicos do que privados. O documento procura registrar gastos que não estão contabilizados pela prefeitura, entre os quais contraprestações públicas vinculadas a parcerias público-privadas (PPPs) do Porto Maravilha e do Parque Olímpico.


“A propaganda de que a Olimpíada seria puxada na sua maior parte por recursos privados só se sustenta com a omissão de gastos, com a deturpação dos dados”. Por isso, o dossiê tenta mostrar que, na realidade, o poder público é que está financiando o evento. Pelos cálculos do governo, o setor público responde por gastos de R$ 16,46 bilhões com o evento esportivo, ou o correspondente a 42,6% do total de R$ 38,67 bilhões, ficando o restante (R$ 22,21 bilhões), equivalente a 57,4% do total, com o setor privado.

Segundo o Comitê Popular, a inclusão dos custos omitidos elevaria o orçamento dos Jogos para R$ 39,12 bilhões, repartidos R$ 24,31 bilhões para o setor público (ou 62,1% do total), e R$ 14,81 bilhões (37,9%) para o setor privado.

Meio ambiente


Além do descumprimento de um dos maiores compromissos assumidos para os Jogos do Rio, que é a despoluição da Baía da Guanabara, o documento cita o caso da construção do campo de golfe, que “envolve a destruição de parte de uma área de preservação ambiental, o favorecimento de grandes empreiteiras com o aumento do índice do potencial construtivo na Barra da Tijuca em troca desse empreendimento. São escândalos ambientais vinculados a intervenções da Olimpíada”, afirma o professor do Ippur-UFRJ.



O golfe voltou a ser uma modalidade olímpica para a Rio 2016, depois de 112 anos fora dos Jogos. O documento destaca que apesar de o município do Rio de Janeiro já ter dois campos de golfe que recebem provas internacionais disputadas no Brasil, que são o Itanhangá Golf Club e o Gávea Golf Club, a prefeitura decidiu construir mais um campo na cidade. O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro questionou as irregularidades ambientais referentes ao campo de golfe mas, apesar disso, as obras continuaram e o campo foi inaugurado pelo prefeito Eduardo Paes no último dia 22 de novembro.

Esportes

O dossiê inclui vasto relatório sobre a questão dos esportes como extensão da Olimpíada. Para Orlando dos Santos Júnior, o evento não vai deixar um legado de equipamentos esportivos para a cidade. “Muito pelo contrário. Nós perdemos a oportunidade de recuperar o Estádio de Remo. As estruturas vão ser provisórias”. Lembrou que o Estádio de Atletismo Célio de Barros e o Parque Aquático Júlio de Lamare vão continuar fechados. “Você não tem espaço para treinamento dos atletas. Tem uma oportunidade perdida de investimento em equipamentos esportivos”, sustentou o pesquisador do Observatório das Metrópoles.

Além dessas temáticas, o dossiê traz denúncias relacionadas, por exemplo, a criança e adolescente, trabalho escravo, repressão a camelôs e a prostitutas. “Vários grupos estão sofrendo os efeitos da repressão promovida pelo governo municipal”. Segundo o coordenador, o dossiê é uma tentativa de mostrar que esse Projeto Olímpico está, na verdade, a serviço de um projeto de cidade excludente, na medida em que obras e intervenções são feitas sem participação popular, com favorecimento a grandes empreiteiras, “que são as mesmas”. Reiterou que os cariocas estão perdendo a oportunidade de promover uma cidade mais justa, mais integrada. “Nós estamos muito distantes de promover uma Olimpíadas da integração social e estamos efetivamente vendo uma política de exclusão social sendo implementada na cidade do Rio de Janeiro”.

Prefeitura do Rio de Janeiro

Procurada pela Agência Brasil, a prefeitura do Rio encaminhou, por meio de sua assessoria de imprensa, documento da Secretaria Municipal de Habitação e Cidadania, que assegura que o município do Rio de Janeiro tem enfrentado, em seu processo de transformação, o “desafio de implementar obras mexendo o mínimo possível na rotina dos cariocas”.Isso inclui, por vezes, a necessidade de desapropriação ou do reassentamento de famílias que morem na área de influência de intervenções públicas, informou. Deixou claro, entretanto, no tocante a remoções, que a administração municipal “não utiliza o instrumento da remoção, quando as famílias são retiradas à revelia do imóvel e não são dadas condições de transição para elas”.
A prefeitura não comentou as outras denúncias formuladas pelo dossiê.

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